24 de dezembro de 2004

enquanto o vocalista canta há, durante quase todo o show, uma espécie de grande segunda voz. parece como se brinca de voz de fantasma. na verdade pode ser apenas a voz do mal que circunda. não o mal, que ele talvez nem exista, mas a infelicidade de qualquer coisa. às vezes tudo sai claro e vem até um dedilhado, um solo. é preciso mesmo fazer um bocado de barulho para a voz atrás das coisas resolver aparecer. ou o contrário. porque não há regra, o que há sempre é o que não se vê mas está lá e determina o que se vê. isso sequer é novidade.
agora estamos aqui conversando. quem olha só vê um de nós. mas estamos os dois. não, eu não pensei isso depois do que veio antes, em cima. isso é que veio antes. mas aquilo nem é novidade. mas quem vê de fora vê apenas um de nós. somos loiros e a luz é meio esverdeada. tudo é meio esverdeado. quem está falando é voce, mas só eu sou visto/vista. você fala atrás e eu ouço, não mudo minha expressão ou quase nem se percebe qualquer mudança. de repente você faz a volta em mim. meia volta completa. meia e completa juntos não parece funcionar mas é isso mesmo. você faz meia volta completa em mim enquanto eu começo a falar. é bonito de ver pra quem vê de fora, é claro pra nós não parece tão bonito. ou para mim parece mas pra você... eu nem sei onde voce está agora. comecei a falar e houve uma parte no seu movimento em que pareceu que a voz saiu de você e veio para dentro de mim para sair da minha boca e você ter que ouvir tudo. nunca suponho a voz que sai de cada boca. agora enquando eu falo é você quem aparece de frente e não é para mim. de um certo ângulo, alguém poderia pensar que quem fala é você. eu.
aquelas flores que não foi você quem me deu continuam no vaso. Acho, com frequencia que, se eu tomasse a água onde elas descansam, eu morreria. seria como o veneno do que não há – mas que segundo eu devia haver - nas flores uma forma de me matar ou te matar. nem penso mais nessa distância entre odiar e amar. fico imaginando, enquanto é tua vez de falar que te ofereço um pouco da água numa daquelas canecas de metal em que eu enchia a cara de café ou do que tivesse.
decidimos ir embora separados e acabamos indo juntos. olhamos de cima e vemos os dois pares de tênis, que você no começo achou iguais, o que eu desmenti, caminhando parecem caminhar por si só e caminham. o corpo sabe o que fazer a maioria das vezes. vem antes da razão e faz. eu só conheço os resultados e também o que falo só conheço enquanto é falado. é bonito olhar os tênis de baixo enquanto andam eles vão andando e parecem mais ainda andar sozinhos. são mesmo quase iguais, os quatro. o chão virou um vidro e vemos de baixo que caminhamos em cima dele. lá longe nossas cabeças não conversam. ninguém está atrás de ninguém nem temos cabelos claros. no máximo olhamos um para o outro. fixamente. às vezes tanto que quase caímos por esquecermos do chão e dos tênis. hoje não apostaria mais no que podia estar na sua cabeça. nem antes.
depois de muito tempo você disse que sua mente é londres e que eu estava em londres. o perfeito estado de não estar é igual à maior possibilidade de esquecer. não, não é uma conclusão, é só do que me lembrei agora. as pequenas obsessões adaptadas fazem comédia de erros nos dias chocando expectativas. só dá mesmo para rir da espera de doze horas de um oi que não acontece nem nunca disse que aconteceria.
somos quatro em volta da mesa com um conhaque e um vinho posso ser a única moça ou o mais empolgado com poemas, pois bebemos igual e fumamos muito. sei que vejo e portanto não sou o que acende o cigarro com um incenso. nem é por graça ou poesia mas acabaram os fósforos e a última coisa que foi acesa, contra minha vontade, foi o incenso. agora até gosto dele. pareço um repórter, talvez devesse pela possível beleza da imagem, omitir o problema de falta de fósforos.

5 comentários:

Anônimo disse...

risperidona ou olanzapina, mas vão acabar causando sintomas extrapiramidais...

brincadeira besta.

li tudim, melhor pra mim.

Lady Pink disse...

"só dá mesmo para rir da espera de doze horas de um oi que não acontece nem nunca disse que aconteceria."

...

e eu respiro fundo. minha cabeça doi, meus braços doem e meus olhos parecem não querer ficar acordados.

Anônimo disse...

Nossa, o template ficou lindo!!!
beijos
F.

Anônimo disse...
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Anônimo disse...

Gostei muito do texto. Parabéns(será que é necessário?). Li o texto enquanto tento aprender a gostar de Pixies, mas, não foi uma combinação muito boa. Tlavez Bob Dylan seria melhor...
Abraço.